Era a primeira vez que a professora Cristiane Maeda colocava os pés no Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Aquele 20 de julho teve um efeito mágico, porque o espetáculo que ela estava prestes a ver não era de música ou teatro, era de educação. Cristiane estava entre os dez docentes homenageados por sua trajetória nos dez anos da OBMEP e chegava ali para receber o reconhecimento. De Pilar do Sul, município rural do interior paulista, ela foi até o Rio de Janeiro para a Cerimônia Nacional de Premiação da OBMEP 2014, onde também aconteceu a celebração de uma década de Olimpíada. A homenagem veio na forma de um troféu, recebido diretamente das mãos do Professor Artur Ávila, medalhista Fields em 2014, e dos ministros da Educação e da Ciência, Tecnologia e Inovação. A cereja do bolo foi o local da celebração, o Theatro Municipal do Rio de Janeiro. "Foi tudo maravilhoso. O teatro é lindo, e receber todo esse reconhecimento... não tenho nem palavras. Ser escolhida entre os dez do país é muito especial. Voltei revigorada para melhorar o ambiente da minha escola", conta a professora de 46 anos.
Cristiane ressalta a importância que eventos como esse têm para incentivar os jovens a estudar Matemática. Uma das companheiras de magistério, Andréia Nascimento, resume a importância da OBMEP para o estímulo dos alunos: "Antes de 2005, a gente sempre trabalhou e incentivou os alunos a seguir carreira e correr atrás de vestibulares e cursos acadêmicos de matemática, mas não tinha como contar algo do tipo olha, vocês têm que correr atrás do sonho porque é possível, porque outros já conseguiram, olha só isso aqui. Até que um aluno foi premiado com medalha de ouro e uma aluna com bronze. Cristiane se lembra de quando o professor Ávila recebeu a Medalha Fields, no ano passado, e da emoção que as crianças tiveram ao conhecê-lo pessoalmente no dia da cerimônia da OBMEP: "Quando ele recebeu a medalha, eu levei a reportagem para a aula, para os alunos verem até onde a matemática é capaz de levar alguém e, um ano depois, ali estava ele, conosco. Fiquei encantada. A simplicidade dele ao tratar com a molecada, o exemplo que ele dá para eles é muito importante."
Muitos anos antes de subir ao palco do Municipal, porém, esse exemplo era exatamente o que Cristiane procurava para mostrar a seus alunos o potencial da Matemática. Lá atrás, na primeira edição da OBMEP, em 2005, ela esteve entre os professores premiados e foi fazer um curso de especialização no Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). "Voltei falando para os alunos de todos os jovens que encontrei por lá, felizes, se divertindo e estudando matemática, inclusive em cursos de férias. Queria muito mostrar para eles que é possível sim pesquisar e trabalhar com matemática de forma agradável", lembra a professora.
Cristiane tem 28 anos de magistério e já formou uma nova geração de professoras de Matemática. Na Escola Estadual Vereador Odilon Batista Jordão, onde trabalha, duas colegas suas no departamento da disciplina foram também suas alunas. Mas foi quando a primeira edição da OBMEP chegou à escola, em 2005, que o trabalho ficou mais divertido. Na primeira edição da Olimpíada, ela inscreveu seus alunos e teve um bom resultado: o colégio ficou entre os cem premiados, dois alunos passaram para a iniciação científica Jr. e a própria Cristiane recebeu um prêmio. Voltando para a rotina escolar, ela animou suas colegas de trabalho e repassou o que aprendeu. Andreia, que também trabalha na Odilon, foi uma das colegas que se animaram com os resultados de seus alunos. “Também ficamos empolgados. Passamos a dar mais incentivo aos alunos, a correr atrás de exercícios que tivessem a ver com as questões da OBMEP e a estudar as provas nas aulas. Desde então, temos premiados todos os anos, entre medalhas e menções honrosas."
O segredo do sucesso, Cristiane conta, são os próprios alunos. "São eles que fazem a gente ter essas conquistas. Confesso que fui uma professora privilegiada de poder estar com essa turminha. Peguei um grupo de alunos no início do fundamental dois, fui com eles do sexto ano do ensino fundamental até o último ano do ensino médio. Com eles, foi o começo, o estouro. Já na terceira Olimpíada tínhamos vários alunos premiados", lembra Maeda. Na sua "fórmula", dois fatores são importantes: o interesse dos alunos e o acompanhamento contínuo durante os anos com a mesma professora. Cristiane enfatiza a importância da boa relação com os alunos, e os prêmios que eles recebem retornam para ela na forma de orgulho e motivação.
A OBMEP acabou se tornando um evento na escola e na cidade. "Há faixa na porta da escola, painel com os alunos classificados, camisa, festa no anfiteatro municipal, até matéria no jornal da cidade tem. A gente se esforça, organiza, se empenha, chama os alunos um por um para participar." O envolvimento dos alunos e professores chamou a atenção de uma outra colega, Silvia Miranda, que chegou à escola há nove anos. "Logo no primeiro dia, vi o painel na porta da escola com os nomes dos medalhistas da OBMEP e pensei: nossa, que legal essa escola em que estou chegando! Todas as professoras comentam como a Olimpíada é importante não apenas para os alunos, que se sentem motivados a estudar mais, mas também para os professores, estimulados a levar suas turmas cada vez mais longe.
O resultado, conta Cristiane, é um efeito de propagação dos bons métodos de educação. "É interessante porque temos percebido um efeito de contágio positivo, não apenas entre nossos alunos, mas entre as outras escolas que percebem nossas premiações e também tomam iniciativas. Temos uma escola vizinha, por exemplo, que já está tendo bons resultados depois que viu nosso desempenho". Cristiane não se mostra preocupada que outras escolas estejam seguindo seu exemplo - na verdade, fica até feliz. "Sei que é uma competição, mas o intuito é esse: que a educação dê certo". E garante que, se houvesse OBMEP quando era estudante, com certeza ela estaria dentre os inscritos.
Outra relação importante é entre os professores e a diretoria da escola. Vera Lúcia Proença chegou à diretoria da Odilon há seis anos e logo de cara percebeu a integração da equipe. "Quando assumi o cargo, a Cristiane veio conversar comigo para dizer o quão importante era o apoio da direção nas preparações para a OBMEP", lembra a diretora, que ajuda diretamente a equipe de matemática na promoção do evento. Os alunos classificados para a segunda fase são convidados para uma conversa onde se explicam todos os detalhes. Os pais também são chamados, e pede-se que eles deem o maior apoio possível a seus pequenos atletas dos problemas matemáticos.
Sobre apoio familiar nos estudos da OBMEP, Cristiane também sabe muito bem. A partir da segunda edição, quem passou a participar foi seu filho, Rafael, hoje com 20 anos. Recebeu, então, menção honrosa e, na edição seguinte, em 2007, foi medalhista de bronze, passando a integrar o corpo de alunos do PIC. Foi quando Cristiane teve maior contato com o programa. "Vi que eram questões bem elaboradas e até me motivou a estudar também, porque algumas coisas ali eu mesma teria que me lembrar para ajudá-lo a se preparar", confessa a mãe, que se deliciava em ver como o filho amava ir aos encontros regionais do PIC. Deu tão certo que hoje Rafael cursa Engenharia de Controle e Automação.
Rafael é somente um dos muitos jovens que Cristiane guiou no caminho da Matemática e áreas afins. Muitos outros alunos seus também tiveram sucesso na carreira acadêmica, e um deles, Marcelo de Paula Rosa, chegou a ir a Berkeley, na Califórnia, pelo programa Ciências Sem Fronteiras, e hoje trabalha com matemática. "Cheguei a estudar música por um tempo, mas senti saudades da matemática. Desde o ensino fundamental, eu gostava das exatas, mas foi na OBMEP que percebi que a matemática me despertava algo a mais", lembra o jovem de 24 anos. Que a Matemática continue despertando jovens como ele por todo o Brasil.